Fligê conta a história da mulher que idealizou a ABL mas não se tornou imortal

A Rota da Palavra IV deste sábado, 18, penúltimo dia da Fligê, trouxe para o público da Feira uma personagem pouco conhecida, a escritora Júlia Lopes de Almeida. Embora tenha sido a escritora brasileira mais publicada da Primeira República (1862-1934), poucos conhecem a sua obra e o papel de significância que esta carioca, filha de lisboetas, exerceu sobre a literatura brasileira. Coube à pesquisadora Clara Carolina Santos apresentar a mulher idealizadora e fundadora da Academia Brasileira de Letras – ABL que nunca se tornou imortal da instituição.

Sob o tema Júlia Lopes de Almeida: o feminismo de vanguarda na Academia Brasileira de Letras no XIX, o evento passeou sobre a história da escritora que numa época em que as mulheres enfrentavam inúmeras barreiras sociais e simbólicas, ela conseguiu se profissionalizar como escritora e construiu uma carreira literária bem-sucedida.

Júlia foi pioneira da literatura infantil no Brasil, escreveu para O país, Jornal do Comércio, Gazeta de Notícias e A Semana e, junto com outros escritores e intelectuais brasileiros idealizou e fundou a ABL, no entanto, seu nome foi substituído pelo de seu marido Filinto de Almeida e excluído dos “40 imortais” fundadores, que optaram por manter a entidade exclusivamente masculina, aos moldes da “Académie française”, a partir da qual inspiraram a do Brasil.

No ano em que a Fligê homenageia a escritora Conceição Evaristo, a primeira escritora negra que pode vir a se tornar uma das ocupantes de uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, Clara acredita que este seja um momento simbólico e significativo para se trazer à tona a história de Júlia Lopes de Almeida.

“É a mesma luta que a Júlia passou lá no começo da ABL, quando ela não pôde ocupar a vaga. Hoje nós vemos grandes escritoras, como a Conceição, tendo um enfrentamento para ocupar uma cadeira de imortal, às vezes com mais dificuldade que escritores homens”, explica.

O veto à participação de mulheres na ABL só terminou em 1977, com a eleição de Rachel de Queiroz para a cadeira número cinco. Depois dela também se tornaram imortais Dinah Silveira de Queiroz, Lygia Fagundes Teles, Neida Piñon, Ana Maria Machado, Cleonice Berardinelli e Rosiska Darcy de Oliveira. Se for eleita, Conceição Evaristo poderá ser a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira de imortal em 120 anos de criação da Academia Brasileira de Letras.

Apesar de desconhecida, a história de Júlia despertou o interesse do público que participou com curiosidade durante o evento.

“Após conhecer a história da Júlia eu fico pensando que as nossas meninas elas precisam se apossar mais da literatura, saber que existem pessoas que as antecederam e que não desistiram e este é um fato novo, saber que uma mulher estava na criação da Academia Brasileira de Letras”, comentou a professora de Mucugê, Elane Silva, ouvinte da Rota da Palavra.

A revelação de que Júlia Lopes de Almeida estava entre os quarenta fundadores da ABL coube ao seu próprio marido, Filinto de Almeida, anos depois, em entrevista a João do Rio, em 1905.

Texto: Débora Silveira | Fotos: Ailton Fernandes


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